quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Ismália mais desvairada em prosa...

Em um lugar atípico, estranho e incomum, para ela, e somente para ela, porque, para os demais, aquele lugar era mais típico, normal e comum, do que qualquer outro. Mas para ela, Ismália da vida, a torre a que saltar, sonhar e enlouquecer, parecia algo muito além. Era uma lugar interessante, e ao mesmo tempo perigoso. Torre alta de onde se podia ver a planície, o planalto. Perigoso e desconhecido. Interessante e atraente. Ali do alto da torre, podia ver uma multidão que se chocava aos corpos uns dos outros, como se buscassem algo de que dependiam à vida. No meio de sussuros e gritos, de olhares tão invasivos e ao mesmo tempo impessoais. Como se algo tivesse a acontecer instantaneamente para que se tornasse realidade. Sim, porque fora disso, tudo era muito irreal e introspectivo. Ao mesmo tempo que aquelas pessoas se mostravam e se libertavam, poderiam estar fazendo o contrário:  introspectivamente, se escondendo do mundo, num lugar em que o mundo todo ao redor não as veriam, não as perceberiam. Então, para ela aquele lugar, embora estranho e incomum, poderia continuar a contribuir para sua clausura interior, onde escondia a vida, escondia a essência e morria lentamente num medo que reprimia-lhe sempre. Sim ela tinha medo que seu medo fosse percebido. Ela tinha medo de sentir medo. Ou medo que seu medo denunciasse seu descabido medo. Gostou daquele lugar, gostou de olhar do alto e sentir-se sózinha em meio à multidão. Lá poderia dizer ao mundo que não tinha medo, já que ninguém a sondaria tão intimamente para percebê-lo. Já que ninguém a ouviria. Mas algo estava a contecer. E aconteceu. Para seu desespero ou deleite. Viu a lua no céu e viu a lua no mar. Foi surpreendida por uma esperança, algo que poderia acontecer em qualquer lugar, mas foi lá, nesse lugar estranho e incomum. Numa torre estranha, a lua dividia-se em duas faces. Céu e mar. Para que ela mesma desconfiasse, pois de todos os lugares, esse seria o único em que duas luas se mostrariam possíveis, dois caminhos, duas escolhas, duas opções,  e talves uma a tirasse desse estado deprimente em que se encontrava. A torre embora alta, tocava o mar, embora fincada na terra tocava o céu. E ela então se permitiu. Mergulhou de cabeça. E, como por milagre, algo em que ela definitivamente não acreditava a muito tempo, acontceceu. Uma luz se ascendeu. E, ela, embora desconfiada, achou que poderia sim voltar a sonhar, tomar as rédias da própria vida e vivê-la. Sentiu-se plena, sentiu-se forte, sentiu-se menina, sentiu-se mulher, sentiu-se uma estranha dentro da sua vida estranha. Tal como Ismália, na torre pôs-se a gritar, na torre pôs-se a sonhar. Mas ao contrário de Ismália, antes que sentisse criar asas para voar, foi tolhida. Recompôs-se. O chão estava próximo, não estatalhou-se, também não perdeu as asas, pois não as tinha ganhado. Não viu as estrelas do céu porque não o pode alcançar, voou baixo. Não viu as estrelas do mar, porque não pode submergir, voou alto demais. E resignada volta à torre, desce a passos lentos, encontra o chão, conhecido chão que não se encontra em sonhos. Tem que estar bem acordada. Céu e mar, tão fascinantes, dão lugar à terra, que embora dura, é real, é tangivel e não oferece maiores riscos.